Escrevo esta intima memória de mim Para todos aqueles que me querem, Que eu quero.
Para todos aqueles que um dia possam estar sós, Sem ninguém, sem nada,
que e pensem e sintam e que Tenham a coragem de mergulhar
nessa fonte De abismal transparência na qual a matéria quase Não se vê
ou apenas se vê em função da alma
e Dentro da qual se pode sentir intensa e justamente Como somos tão pequenos,
como somos pobres e como Todos os bocadoos de felicidade que temos
são sempre Consequência da nossa luta e esforço para a ter
e Nunca algo ao acaso.
Podemos dár-nos conta do que temos e do que queriamos Ter
e verificar que sempre queremos demasiado
Para aquilo que merecemos na verdade,
Na verdade somos todos bastante egoistas.
Todavia nesta fonte a água mata, mata-nos a todos
Afogando-nos e levando-nos cada vez mais para o fundo,
Para o fundo de si, para o fundo de nós,
onde possamos Sentir que o ar se necessita urgente,
sentir o que o Mundo nos dá e o que dámos ao mundo,
muito pouco ou nada.
Lá no fundo quando estamos reduzidos ao nosso verdadeiro Tamanho,
temos mêdo de voltar a querer ser Grandes
porque intuitivamente sabemos que isso acontece,
Constante e consecutivamente
e nesses momentos não nos Dámos conta do tempo que perdemos
e do quanto nos Tornamos egoistas e idólatras,
esquecendo-nos do que Lá bem no fundo sabemos,
os nossos limites, a nossa Suscetibilidade de perversão,
enfim a nossa incrivél e Desajustada imperfeição,...
um monstro...!
Sei que é dramático isto porque na verdade nunca Deixaremos de sonhar,
de querer, de buscar sempre e Sempre seguindo essa ilusão
para que depois dela Voltemos ao fundo, à nossa fonte,
para que nos mate mais Um pouco,
é o preço do sonho, da busca, do querer tanto e tanto.
É desagradável descobrir-se a verdade,
essa fonte que Nos mata e nos faz julgar como homens de fé e de bem Que podemos ser,
mas não há maior alegria do que Sentir-se morrer, morrer até ao fim, até ao fim de nós,
Egos supersticiosos e imensos, até ao mais sublime Estado de humildade e de fé,
essências (de) do renascer, Sementes dos homens que morrem porque querem viver.
É uma questão que me faz tremer ao escrever o meu Viver, o meu sentir
e o meu decobrir mais intimo mas não Tremo de mêdo, tremo de verdade.
Talvez possa por estas palavras de humilde viver Explicar-vos intimamente
e contar-vos só a vós amigos Meus que tudo mereceis de mim,
toda esta odisseia Sobre a verdade que se descobre na rua,
Nos lugares de ninguém.
Deste que vos quer muito.
barcelona 1-10-1991